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Todo homem pode sentir prazer anal ?
   9 de setembro de 2023   │     13:41  │  0

NA MEDIDA EM QUE VAMOS EXPERIMENTANDO AS SENSAÇÕES, ELAS VÃO SE TORNANDO MENOS DESCONFORTÁVEIS.

Preciso entender melhor essa história de os homens gostarem de ser tocados no ânus durante o sexo. Eles podem ser considerados homossexuais? 

Amiga, nosso corpo é cheio de zonas erógenas, regiões onde o toque pode causar prazer e excitação. O ânus é uma delas.Sentir prazer na região anal não significa que a pessoa seja homossexual, pois a forma como se transa não define a homossexualidade, mas, sim, o desejo. Assim, a homossexualidade é definida pela atração e pelo prazer em relacionar-se com indivíduos do mesmo sexo. A prática de sexo anal, não.

Alguns homossexuais não gostam de ser penetrados e preferem a prática oral à anal. Sexo anal é uma opção e não uma condição da homossexualidade. Se o homem sente prazer na região anal, e essas carícias vêm de uma mulher, ele é heterossexual.

Preconceito

Apenas o fato de um homem gostar de carícias anais não é suficiente para definir sua homossexualidade. Alguns, inclusive, sentem medo e aversão em ser tocados na região anal. Isso passa muito pelos preconceitos que cada pessoa leva consigo. As mulheres também sentem o mesmo.

Qualquer parte do nosso corpo pode se tornar uma região erógena, basta que seja estimulada devidamente. O ânus é uma delas. Sentir prazer na região anal é um privilégio que pode ser dado a qualquer um, seja ele homo ou heterossexual, seja homem ou mulher.

No sexo, na medida em que vamos experimentando as sensações, elas vão se tornando menos desconfortáveis e passam a ser mais agradáveis, até chegarem a ser prazerosas e excitantes.

Fazer sexo com prazer e com a pessoa escolhida é maravilhoso. Se permita fazer práticas saudáveis, desde que não causem dor nem sofrimento a nenhum dos parceiros. Tudo o que for feito de forma segura e com prazer está liberadoentre o casal.

 

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Sexo anal, o último tabu do homem hétero
   20 de março de 2021   │     18:46  │  0

O que você, mulher, pensaria se o seu parceiro explicitasse o desejo de ser penetrado no ânus durante a relação sexual? E você, homem, gostaria de ter ou já teve essa experiência ou nem pode ouvir falar no assunto? Antes de dar a resposta, saiba alguns detalhes sobre essa prática. E o primeiro deles é que essa região do corpo é igual em homens e mulheres e ambos podem ter prazer a partir de estímulos nessa parte do corpo.

Não cabe dúvida de que o ânus é uma zona erógena com uma enorme carga simbólica, cultural e social. Durante muito tempo foi o anticoncepcional mais seguro e a única maneira que as mulheres tinham de chegar virgens ao casamento, embora não inexperientes. Talvez por isso, entregar o traseiro era sinônimo de lascívia e entranhava também um grau importante de submissão.

Na Grécia e Roma antigas, como conta Valérie Tasso em um artigo a respeito, “não existia nenhum impedimento pelo qual essa zona não pudesse ser utilizada por um homem para o prazer, independentemente de que fosse o ânus de uma mulher ou o de outro homem. Só havia uma regra de ouro que nenhum homem que se prezasse podia violar: devia ser sempre o agente ativo, e nunca um mero sujeito passivo (isso era coisa de mulheres, escravos ou efebos).

Há alguns anos, começou a falar-se do bud sex (bud nesse contexto significa colega ou amigo). Homens héteros que mantêm relações homossexuais, mas que não se consideram gays. Além disso, muitos exibem também condutas um tanto homofóbicas.

Em 2017, um sociólogo da Universidade do Oregon, Tony Silva, dedicou-se a estudar este fenômeno, que ocorria geralmente entre homens brancos que viviam num meio rural, nos EUA. Silva, a quem entrevistei para um artigo, relacionava esta prática aos múltiplos fatores que afetam a identidade sexual, como a cultura, o contexto social, o lugar, o momento histórico e as interpretações pessoais. “De fato”, dizia este sociólogo, “as identidades sexuais, tal como as conhecemos hoje em dia (héteros, gays, lésbicas, bissexuais etc.), só foram classificadas entre meados e o final do século XIX, e a forma de entendê-las não é a mesma em todo o mundo. Mas não só isso: como se viu no estudo, pessoas com a mesma cultura podem ter práticas sexuais similares, mas interpretá-las de formas distintas, dependendo do conceito que tenham da sua própria sexualidade”.

Para Silva o termo bud sex poderia ser aplicado àquelas relações que seus participantes interpretam como ajudar um amigo (em que está ausente o fator romântico), entre homens brancos e heterossexuais, ou secretamente bissexuais. São encontros secretos, sem consequências e sem associação nenhuma a ideias como feminilidade ou homossexualidade.

Nesta evolução da conduta sexual, alguns homens cogitam agora explorar, na própria carne, o prazer que o sexo anal pode lhes proporcionar com suas parceiras. “Mas fazem isso muito timidamente e procurando sempre uma permissão profissional ou social”, observa Raúl González Castellanos, sexólogo, psicopedagogo e codiretor do Ars Amandi, centro de terapias sexológicas e psicológicas em Madri.

“O beijo negro ou anilingus [estimulação oral do ânus], praticado por sua parceira, é algo mais fácil de aceitar para um hétero, mas o fato de ser penetrado já é outro assunto”, diz González Castellanos. Serena, massagista erótica que trabalha em Madri e se anuncia na Internet, reconhece que muitos homens lhe pedem o extra do pegging (penetração anal com um dildo e um arnês). “São heterossexuais, mas querem provar esta prática ou já a provaram e acham muito excitante. Entretanto, não se atrevem a pedir às suas mulheres ou parceiras, por medo da sua reação”, conta Serena.

Anos atrás, guardei um recorte do EL PAÍS sobre um espetáculo — um monólogo que a atriz Isabelle Stoffel apresentou na capital espanhola e no Festival do Edimburgo, lá por 2013. A obra se chamava A Rendição, falava de sexo anal, e Stoffel argumentava teorias como estas: “No cu, a verdade sempre vem à luz. Um pau num cu é como a agulha de um detector de mentiras. O cu não mente: se ele mente, dói em você”. Ou esta outra: “Na sodomia, confiança é tudo. Se você resistir, podem te machucar de verdade. Com esta prática aprendi muito, mas sobretudo aprendi a me render”.

O ponto G masculino

“A zona localizada entre os testículos e o ânus (incluindo também este) é uma zona muito sensível”, diz Marta Jesús Camuñas, sexóloga e psicóloga da Amaltea, centro de educação e medicina sexual em Zaragoza. Aí fica o períneo e muitos localizam o ponto G masculino, no interior do reto, a 4 ou 6 centímetros de profundidade. “É uma zona em contato com a próstata, que alguns homens relacionam com uma sensação muito prazerosa. Embora, como ocorre no sexo, o prazer dependa de muitos fatores, além do fisiológico. Há a situação e a companhia, que influenciam poderosamente no desejo”, afirma a especialista.

Os benefícios da massagem prostática é outro dos argumentos que os curiosos ou os amantes desta prática esgrimem. “Qualquer parte do corpo que receba uma estimulação correta será beneficiada”, comenta González Castellanos, “mas ainda se sabe pouco a respeito, embora já tenha ficado demonstrado que a ejaculação frequente não é boa apenas para a espermatogênese [produção de espermatozoides], mas também para adiar os problemas de próstata, apesar de antigamente dizerem que estes transtornos eram o castigo divino aos homens promíscuos. Levar a zona anal em conta também pode ser uma opção sexual a mais para homens que, por determinadas circunstâncias, não tenham ereções”, conclui o sexólogo.

Para os que estiverem dispostos a explorar a porta de trás, sem medo das etiquetas ou preconceitos, González aconselha que “seja algo combinado entre as partes e que haja um mínimo ingrediente de curiosidade e desejo. É preciso também reforçar a higiene e ir muito devagar, já que a musculatura do esfíncter anal é concêntrica e será preciso dilatá-la pouco a pouco”. As lojas de brinquedos eróticos já dispõem de pequenos dildos e de lubrificantes especialmente desenvolvidos para essa área delicada. A zona da verdade, como a chamava Stoffel.

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Um corpo mais bonito não vai te trazer um namorado
   25 de fevereiro de 2017   │     0:00  │  0

Triste e sincera realidade hoje em dia: para a maioria dos gays, um corpo perfeito é bem mais interessante do que uma personalidade marcante.

Basta ter quadradinhos na barriga. Basta sair bem na foto sem camisa. Basta ser gostoso.

Parece até que um “homem gay ideal” precisa ser melhor do que um heterossexual. Mais bonito, mais culto, mais estiloso…

É como se a “falha” da homossexualidade tivesse que ser compensada com uma série de qualidades fabulosas de anúncio de revista. Dentes brancos, cabelo liso e bem penteado, porte atlético, barba desenhada.

Gays lindos e sedutores? Só quando parecem com uma coleção de bonecos Ken…

Daí muita gente acha que, para conquistar um namorado, é preciso antes frequentar uma academia. [Sério?]

É bem verdade que, geralmente, os boys mais gostosos estão procurando homens gostosos como eles. Também é verdade que, quanto mais sarado você estiver, mais irá atrair caras também sarados.

Você, definitivamente, chamará atenção nas festas, no parque, no aplicativo, no supermercado…

Mas será esse mesmo o tipo de cobiça que precisa se está procurando um relacionamento sério?

De um cara normal a objeto sexual

Diego (leitor aqui do site) estava solteiro há anos. Desiludido com os frequentes pés na bunda, ele chegou à conclusão de que o seu problema só poderia ser a aparência física não ideal.

Não que ele fosse obeso e horroroso. Nada nem perto disso! Ele era um cara normal. Desses magrinhos e com a barriga um pouco flácida.

Pois bem, um novo ano começou e, com ele, a nova a vida fitness do Diego – uma das suas resoluções de Réveillon era arranjar um boy, afinal.

E ele levou o plano bem a sério: passou a ir na academia quatro vezes por semana, mudou completamente a alimentação e mandou ver na proteína.

Resultado? Em menos de 6 meses, Diego ficou sarado.

Com os ombros largos e os quadradinhos na barriga vieram também uma enxurrada de convites para sair.

Nosso leitor contou que nunca transou tanto na vida. O seu Grindr nunca bombou tanto, a sua conversão na balada nunca foi tão alta.

Realmente, falta de boy já não era uma reclamação. Nem falta de sexo: oportunidades surgiam sem demandar muito esforço.

O problema foi que, depois de um encontro e outro, o Diego se deu conta de que havia se tornado quase um objeto sexual (palavras dele).

Os boys já lhe viam como um pedaço de carne, pronto para o abate. Nenhum se mostrava interessado em saber mais sobre o cara interessante que morava por baixo do abdômen esculpido.

Daí a noite acabava, os dois gozavam e, no outro dia, era apenas mais uma foda com um homem gostoso para contabilizar.

E a resolução de Ano-Novo? Bom, essa ficou para a próxima sessão de 7 ondas…

Um corpo mais bonito não vai te trazer um namorado. Uma personalidade mais bonita sim.

Não se engane: um corpo escultural pode até te ajudar a conseguir mais sexo, mas não necessariamente vai te trazer um namorado.

Depois de entrar em forma, você poderá descobrir que os seus músculos estão atraindo mais homens interessados somente em diversão e trepadas casuais.

As horas de malhação certamente vão te proporcionar muitas horas de sexo. Mas o amor precisa de algo mais. Sentimentos reais têm dessas coisas…

Não estou dizendo que você deve deixar de ir na academia e comer batata frita todo dia. Claro que não! Apenas que o mesmo foco em cuidar da boa forma seja dedicado para cuidar de você. Que você se preocupe tanto ou mais com a sua autoestima, com o seu desenvolvimento pessoal.

E que fique bem claro que saúde faz parte de tudo isso. Você deve, sim, praticar esportes e ter uma boa alimentação. Mas porque isso te faz bem, não porque deixará o ken da balada de pau duro.

Lembre-se: o seu real valor depende de quem é de verdade e do que tem para oferecer ao mundo, não dá quantidade de olhares que recebe dos caras na rua.

Encontre o seu propósito de vidae deixe-o brilhar. Isso sim é mágico, isso sim é magnético. Só isso vai tornar as suas resoluções de Ano-Novo realidade.

Por: Verônica Vergara

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Sexualidade e gravidez entre adolescentes: busca ou desordem ?
   14 de setembro de 2015   │     0:22  │  3

Artigo

Por: Dr.a Elvira Simões Barretto – Professora da Universidade Federal de Alagoas. Graduada em Serviço Social e Doutora em jornalismo , com estudos avançados em jornalismo e ciência da comunicação e da informação como bolsista Alban, pela Universidade Autônoma de Barcelona. Possui mestrado em Serviço Social, pela Universidade Federal de Pernambuco. Atualmente vice-coordenadora e pesquisadora do Núcleo Temático Mulher e Cidadania/UFAL,com experiência de pesquisa nas áreas de gênero, violência, Juventude e comunicação.

Gênero e sexualidade

A história mostra que, desde a Revolução Francesa com o desfraldar de suas bandeiras “Igualdade, Fraternidade e Liberdade”, o gozo de direitos iguais tem sido almejado por parte de grupos sociais até então discriminados, como, por exemplo, o das mulheres. Em função disso a emergência do movimento feminista, junto com outros movimentos sociais nos marcos do capitalismo, se torna compreensível à medida que teoricamente esse regime prevê igualdade para todos perante a lei. Se na prática isso não ocorre, é outra questão, mas o que está implícito nessa colocação é a “garantia” da possibilidade jurídica de se lutar por esses direitos e pela igualdade, aqui compreendida não como direito de ser idêntico/a mas como direito de ter o mesmo valor.

No decorrer da história a mulher vem ocupando lugar desigual em relação ao homem, seja, por exemplo, permanecendo confinada aos gineceus na Antiga Grécia, contando para tal com o aval dos filósofos que justificavam a natureza inferior da mulher 2; seja na Idade Média3 quando os padres da Igreja ratificavam esses princípios, seja no Renascimento que embora considerado época de florescimento científico e filosófico, no que se refere às mulheres, corresponde a uma época de trevas, palco de um dos mais atrozes genocídios que já ocorreu na história: o da caça às bruxas, iniciando com a Bula do Papa Inocêncio VII (1484). Essa grande perseguição vai se intensificar gravemente com a crescente apropriação do saber médico pelos homens. Desde épocas mais remotas cabia às mulheres a arte de curar – raizeiras, alquimistas, curandeiras e parteiras; mas a emergência da “ciência” ou do saber científico torna inadmissível aceitar uma mulher médica.

O fenômeno de caça às bruxas parece estar relacionado com o abalo do poder religioso pela secularização, resultante da ascensão da ciência. Se essa teve como objetivo eliminar a ignorância e a superstição através de métodos racionais, teve também, por outro lado, como contradição, a perseguição às mulheres sábias; essa ciência em formação se fundamentou, segundo Brian Easlea (1981), numa filosofia que excluía as mulheres e ajudava a consolidar a sociedade patriarcal e os interesses masculinos em sua aplicação e resultados. Essa tendência vai se revelar nas idéias de Bacon e Descartes para quem a mulher e a natureza, enquanto entes similares, deveriam ser domadas. 

Na Escolástica foi vetada à mulher qualquer possibilidade de produção de conhecimento, o que por sua vez se constituiu numa das bases de sustentação capitalista para privilegiar o espaço doméstico e o da reprodução como o lugar da mulher. O cartesianismo renascentista significou, por outro lado, o coroamento do processo de identificação da mulher com a natureza, ambas reduzidas à matéria inerte, não criativa, a ser plenamente dominada pelo intelecto humano, ou seja, masculino. Mesmo com a Revolução Francesa, cujo deslanchar contou com a ampla participação das mulheres, estas não terão acesso à cidadania1 e ao mundo público.

Desde então e até os dias de hoje, segundo Ávila e Gouveia (1996), estrutura-se no capitalismo uma dicotomia aparente entre as esferas pública e privada relacionadas respectivamente à produção e à reprodução, organizada de forma hierárquica, onde a segunda está subordinada a primeira.

Considerando como pano de fundo a relação entre ordem social e sexualidade, podemos inferir nesse aspecto que a sociedade moderna se estrutura a partir de dois eixos que encerram contradições em si mesmos: O patriarcado e o liberalismo. O patriarcado forjado nos últimos séculos, situa socialmente as mulheres da classe dominante como seres da esfera privada e sexualmente reservadas à reprodução. O liberalismo materializado na Revolução Francesa que propõe a universalidade de direitos aos cidadãos, mas na prática são apenas direitos para os que podem transitar na esfera pública.

A sexualidade e a reprodução, como uma de suas funções vêm sendo historicamente pretexto para regras e normas de comportamento, tendo em vista a manutenção da ordem social, cultural e econômica do moderno projeto burguês.

Partindo dessa compreensão é possível entender que a discussão crítica2, no âmbito da sexualidade, contribui efetivamente para um processo de revisões de valores culturais que historicamente vêm limitando a capacidade do desenvolvimento humano, na esfera das relações sócio-afetivas de homens e mulheres de todas as gerações. Essa discussão crítica, teve como principal ponto de partida a repressão sexual e, de forma particular a repressão sexual das mulheres.

Nesse sentido, Foucault (1997.p.6), dentro da perspectiva da sexualidade enquanto construção sócio-histórica, afirma que, no mundo moderno, concomitante à circunscrição da mulher no espaço doméstico, a sexualidade é confinada à família conjugal e ao âmbito privado onde se lhe atribui como principal função a reprodução. Seguindo essa lógica, confirma Foucault (1997, p.6): “em torno do sexo, se cala, (…) faz reinar a norma, detém a verdade, guarda o direito de falar, reservando-se o princípio do segredo”, o sexo passa portanto a ter uma natureza pecaminosa.

Segundo este autor, há um questionamento a cerca da teoria da repressão sexual, não no sentido de refutá-la e sim, no sentido de recolocá-la numa “economia geral” dos discursos sobre sexo a partir do século XVII.

Focault (1997) demonstra que nunca se deixou de falar em sexo e faz-nos compreender que quando se fala em sexo é necessário observar quem fala, o lugar de onde se fala e os pontos de vista de quem fala. Entendendo essa necessidade, o autor apresenta ainda um questionamento que se constitui em parâmetro para a pesquisa como um todo. Ou seja: “De que maneira o poder penetra e controla o prazer cotidiano?”, continuando segundo o mesmo:

Partindo desses questionamentos, consideramos importante um diálogo com a linha da pesquisa teórica de Menicucci (1986) acerca da sexualidade. A pesquisadora dá um tratamento sócio – histórico da temática, apreendendo a sexualidade no contexto das desigualdades sociais; e consegue ir além de uma teoria científica da sexualidade e oferece subsídios para uma melhor apreensão do campo de tensão que envolve o tema.

Conforme as argumentações já apresentadas, entendemos ter tornado possível reconhecer a histórica reprodução de relações desiguais e injustas entre mulheres e homens, no exercício de suas sexualidades. Nesse momento, pretendemos tornar perceptível, em diálogo com Menicucci (1986), a questão da opressão e culpabilização do corpo feminino .

Nesse sentido, encontramos na autora uma teorização acerca da existência de “4 (quatro) posses essenciais” do corpo feminino através de dispositivos de saber e poder instaurados na sociedade moderna. A primeira posse subjaz através da “apropriação da alma” pela igreja; a segunda, pela apropriação do corpo através do discurso da desigualdade social fundada na natureza; a terceira posse corresponde a apropriação do excedente a partir da lógica de mercado; finalmente, a quarta posse ocorre com a apropriação do corpo a partir do discurso hegemônico do Estado e seus dispositivos de controle da sexualidade e discriminação das mulheres no exercício de sua cidadania.

A “apropriação da alma” se faz presente através do discurso moralista e normatizador da igreja que, durante séculos, vem desempenhando um papel fundamental no controle do corpo e do prazer da mulher. Podemos citar como exemplos as doutrinas estóicas e eremita dos primeiros séculos da era cristã e o fato de existir como dogmas e/ou temas no seio da igreja católica, o celibato, a virgindade de Maria, a contracepção e o aborto.

A ritualização da sexualidade feminina é um mito do imaginário coletivo onde se estruturou uma história construída acerca da relação entre a mulher e a natureza numa lógica onde a valorização e identidades femininas permanecem centradas na reprodução. Uma outra lógica, da racionalidade instrumental, submete à sua lógica o amor e o prazer que passam a ser regidos pelo princípio da produtividade econômica, banalizando o corpo e mecanizando o prazer.

Diretamente relacionada com essa mulher “mãe pela própria natureza” está a terceira “posse essencial” que atribui como natural a condução dos trabalhos domésticos, configurando as duplas e às vezes triplas jornadas de trabalho, particularmente as mulheres dos setores populares – que representam a maioria da população feminina no Brasil. Além do que, naturaliza-se a diferenciação salarial de algumas mulheres em relação a seus colegas do sexo masculino por justificativas relacionadas a essa concepção de mulher. E finalmente, a quarta “posse essencial” está relacionada ao poder do Estado e as suas leis.

É nesse mesmo contexto de domesticação, submissão e controle do “corpo” feminino que se forja na teoria e na prática política do movimento social feminista a desconstrução das raízes culturais e que vêm reproduzindo a representação da “opressão como destino” o que vai, a partir daí, influenciar o curso da história e da vida.

Temos que levar em consideração o contexto de emergência desse movimento acima referido, tendo em vista o ascendente processo de complexificação sócio- cultural do mundo contemporâneo. Nesse sentido, dialogando com Nízia Villaça e Fred Góes (1998) vale ressaltar que na era industrial o corpo era manipulado como instrumento da produção, lugar da disciplina e controle. Na sociedade pós-industrial, caracterizada pela difusão do saber e da informação, por uma tecnologia que ultrapassa a ciência e a máquina para tornar-se social e organizacional repensa-se esse controle. Nesse sentido os/as autores/as questionam: O corpo dominado é apenas o do trabalhador? E nós acrescentamos: O corpo dominado é apenas da mulher? Assim argumentam os/as autores/as:

O novo aspectro global de fluxos, redes e imagens é destinado a controlar sobretudo o cidadão consumidor través da produção incessante de serviços e desejos. O que percebe é que uma leitura do corpo como construção narcísico-hedonista, disciplinado pelas regras da estetização geral da sociedade pós-industrial, pode incidir numa versão redutora do papel do corpo.

Ressaltam os/as autores/as que não se trata apenas de um corpo disciplinado, obedecendo cegamente às regras do look1, no sacrifício ascético em prol da manutenção da juventude e da bela forma. Com base em Maffesoli, os/as autores/as afirmam que o corpo, não é apenas veículo de aparência enganosa, mas lugar de fascínio, sedução, criação de alianças, via pactos estéticos que celebram o prazer, a criatividade e o humor.

Mesmo considerando a argumentação acima compreendemos que a contribuição de Foucault (1984) deve ser considerada na contemporaneidade por reconhecer que a complexidade do contexto sócio-cultural traz consigo as várias faces de uma mesma moeda: passado, presente e sementes de futuro entrelaçados.

Nesse sentido, reconhecemos que Foucault (1984), há muito, desmonta a representação fixa sobre sexualidade no exercício das práticas sexuais, e desvela as formas institucionais de controle destas práticas, como a igreja, a família e o Estado. O pesquisador já se preocupava com a própria organização social da sexualidade considerando suas especificidades, de acordo com cada época e cada cultura.

Pesquisadores/as como Isaac Balbus (1987), Judith Butler (1987) e Susan Bordon (1997), por exemplo, filiam-se à perspectiva acima, abrindo um diálogo com Foucault. Bordon (1997), por exemplo, conduz-nos à reflexão, com base em Foucault e Bourdieu, de que o corpo não é apenas um texto da cultura mas também um lugar prático e direto de controle social. Por outro lado, nossos princípios políticos conscientes, nosso engajamentos sociais, nossos esforços de mudança podem ser, segundo a autora, solapados e traídos pela vida dos nossos corpos, não o corpo instintivo e desejante concebido por Platão, Santo Agostinho e Freud, mas o corpo dócil e regulado, colocado a serviço das normas da vida cultural e habituado às mesmas.

Ressalta Bordon (1997), com base em Foucault, que por meio da organização e da regulamentação do tempo, do espaço e dos movimentos de nossas vidas cotidianas, nossos corpos são treinados, moldados e marcados pelo cunho das formas históricas predominantes de individualidade, desejo, masculinidade e feminilidade.

Dessa maneira Foucault contribui, como afirma Corrêa (1996), para o entendimento de que o controle e a conformação da sexualidade não se reduzem às mulheres e ao campo da reprodução; entretanto é necessário focar a variabilidade de práticas sexuais que fazem parte da sexualidade humana. Se, antes trata de uma oposição simples entre liberação e repressão hoje a questão é mais complexa. Nesse sentido assumir posições simplistas propicia a atualização e a legitimação das representações e práticas tradicionais, conservadoras. Essas práticas teimam a se reproduzir na cultura brasileira.

Concordamos com essa perspectiva, reconhecendo a existência de raízes culturais reprodutoras de repressões sexuais, até os dias atuais; consideramos que, no campo da sexualidade e da reprodução, homens e mulheres – cada um assumindo suas orientações sexuais -, são discriminados/as, a exemplo, da inexistência de regulamentação não discriminatória em relação à guarda paterna dos filhos (LYRA, 1997). Um outro elemento consiste na falta de uma definitiva regulamentação da interrupção da gravidez, e da questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Com base em Barbiere (1993) é de se reconhecer as diferenças anatômico-fisiológicas dos corpos humanos, pois homens e mulheres têm a capacidade, desde a infância, de produzir com o corpo. Homens e mulheres temos a possibilidade de produzir prazer no corpo do outro/a, mas somente as mulheres têm um corpo que produz outro corpo.

Mulheres e homens somos imprescindíveis para a fecundação, mas somente o corpo das mulheres tem garantido, até o momento, a sobrevivência do embrião e, portanto a espécie humana(…)o corpo feminino na idade reprodutiva é valioso e há aí um poder particular, específico do corpo das mulheres(…)são as sociedades que lhe conferem poder.

Nesse sentido, Rubin (1993) alerta que a fusão cultural entre gênero e sexualidade fez emergir a noção de que uma teoria da sexualidade poderia se derivar da teoria de gênero, na medida em que as relações de gênero afetam o sistema sexual, visto que esse tem manifestações específicas de gênero. Embora gênero e sexo estejam intimamente relacionados, eles não são a mesma coisa, mas constituem a base de duas arenas distintas das práticas sociais.

Em sintonia com esse entendimento, Corrêa (1997), concordando com Rubin (1993) e Scott (1990), concebe os sistemas de sexo/gênero como sistemas de poder dos quais resultam, conflitos e transformações culturais, sociais, políticas e até mesmo econômicas. O uso analítico da categoria gênero se aplica a diferentes contextos históricos e culturais, numa perspectiva não fixa, de natureza dinâmica e relacional, ou seja:

Os sistemas de gênero correspondem à totalidade dos arranjos através dos quais as sociedades transformam a sexualidade biológica em atividades humanas, a partir das quais as necessidades humanas são tanto satisfeitas, quanto transformadas. O poder contido nos sistemas de gênero opera com mais força nos estágios reprodutivos da vida humana, quando os meios para controlar a sexualidade , a reprodução e o acesso às atividades produtivas estão situados e funcionam de maneira mais aguda. Esta definição favorece a desconstrução das diferenças de gênero que foram e continuam a ser interpretadas, racionalizadas como resultado de uma ordem natural biológica imutável, no sentido de pensá-las como circunstâncias construídas social e historicamente e, portanto sujeitas à transformação pela ação social e política. Esta compreensão do gênero como operador social e simbólico também possibilita o exame das relações de poder inter e intra – gêneros (CORRÊA, 1997, p.152).

Segundo Barbiere (1993), a sexualidade é o conjunto de maneiras diversas de se relacionar enquanto seres sexuados, com outros seres também sexuados. Esses intercâmbios, como tudo o que é humano, são ações e práticas carregadas de sentido.

Sexualidade também tem sentido como operador de mediações sociais em que a garantia da reprodução biológica é apenas uma das funções, numa interação complexa com os sistemas de sexo/gênero.

Basicamente os fundamentos do Gênero como categoria de análise teórica podem ser encontrados na teorização de Scott (1990) que parte da elaboração de que “gênero” é um elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é um primeiro modo de dar significado às relações de poder. As mudanças na organização das relações sociais correspondem sempre a mudanças nas representações do poder. Para a autora (1990):

Como elemento constitutivo das relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas, o gênero implica em quatro elementos: 1- os simbólicos culturalmente disponíveis que evocam representações simbólicas, Eva e Maria como símbolo da mulher, por exemplo; 2- os conceitos normativos que põem em evidência as interpretações do sentido dos símbolos. Para a autora2, o desafio é explodir a noção de fixidez e descobrir a natureza do debate ou da repressão que produzem a aparência de uma permanência eterna na representação binária de gênero; 3-o gênero é construído no âmbito das instituições e da política. Em outras palavras, a construção de gênero se faz através do parentesco, mas não exclusivamente, ele é construído igualmente na economia e na organização política, que operam atualmente de maneira amplamente independente do parentesco; 4- a identidade subjetiva intervém na construção dos sujeitos sócio-afetivos. Nenhum dentre esses elementos pode operar independentemente (p.13).

Fazendo referência ao conceito de “gênero”, de Scott, Barbiere (1993) afirma que os sistemas de gênero/sexo são conjuntos de práticas, símbolos, representações, normas e valores sociais que as sociedades elaboram a partir da diferença sexual anatômico-fisiológica e que dão sentido à satisfação dos impulsos sexuais, à reprodução da espécie humana e, em geral, ao relacionamento entre as pessoas.

Culturalmente nos deparamos com duas tendências que giram em torno da compreensão da sexualidade. A primeira é a reprodução como função principal da sexualidade das mulheres e o prazer e virilidade como referente principal da sexualidade masculina; e a segunda tendência é a concepção tradicional do sexo enquanto força vital ou apetite para ambos os sexos. Com base em Corrêa (1996) , compreendemos que essa “força vital” permite o reconhecimento de um sujeito sexual independentemente da procriação no âmbito familiar.

Se por um lado, algumas pesquisas vêm comprovando que o exercício prático da sexualidade não indica a centralidade da reprodução, por outro lado, alguns discursos oficiais, em particular na área de saúde pública, colocam a reprodução como eixo principal da sexualidade.

Vale ressaltar que partimos do pressuposto de que as formas de relações de gêneros na prática da sexualidade podem influenciar diretamente o exercício da saúde sexual e a regulação da fecundidade.

Na pesquisa, a ser tratada no III capítulo, adotamos a perspectiva de sistemas de análise diferenciados para o tratamento das relações de gênero e da sexualidade.

Buscamos na teoria de Gênero a desconstrução da perspectiva de sexualidade centralizada na reprodução sem, entretanto, relacionar mecanicamente sexualidade e gênero.

Essa filiação teórica sintoniza-se com Corrêa (1996) que convoca para uma atualização conceitual oferecendo importante contribuição na sua reflexão que trata da autonomia dos sistemas sexualidade /gênero revisitando alguns autores como Parker e Rubin.

Percorrendo esse caminho, adotamos a perspectiva teórica elaborada por Parker (1984) onde constrói uma matriz tripartite para tratar da “sexualidade” e das “relações de gênero”. Essa matriz consta de uma subdivisão: sistema de gênero, sistema da sexualidade e sistema erótico.

O sistema da sexualidade corresponde ao que ele chama de normativo, como por exemplo, a religião e o discurso médico, pois “nomina dispositivos que reconfiguram as representações da sexualidade”. O sistema erótico ordena com uma lógica própria às práticas sexuais.

Problematizar a experiência e a representação são aspectos pontuados por Corrêa (1996), indicando a direção metodológica para análise dos dados acerca da representação da gravidez e da sexualidade entre adolescentes e profissionais de saúde.

Enfim, concordando com Ávila e Gouveia (1996), a sexualidade é uma vivência que tem como sede primeira o corpo que se relaciona diretamente com os toques e as sensações. Porém este corpo, desde que anuncia a sua vinda ao mundo dos humanos, já é um corpo sexuado e nomeado. Quando um pai ou uma mãe (ou também um avô, avó, tia, tio, ou qualquer outra pessoa) sabe o sexo daquele corpo já lhe confere um nome, em função do gênero: nem que seja menino/a, o/a bebê; criando e desejando para ele uma série de coisas, de laços e bonés até a futura profissão. Antes da própria gravidez ou mesmo da possibilidade dela, já desejamos sexos para os bebês, até quando ainda estamos cronologicamente mais perto deles, ou seja, nas nossas brincadeiras de crianças. É uma trama muito longa e complexa que cria sexos e sexualidades.

Percebemos, em suma, que o sexual permeia, de um modo ou de outro, todas as relações sócio-afetivas; se os sentimentos não são forças naturais mas categorias culturais, nossa maneira de sentir e amar é inevitavelmente ligada à nossa maneira, historicamente determinada, de pensar o sujeito, de construir a noção de pessoas. Portanto, a nossa maneira de pensar tem direta relação com as várias instituições que vêm moldando nossos sentimentos entre elas, a família.

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Bizarro ou cultura ? Exposição pretende dar visibilidade e moralizar o ânus
   21 de janeiro de 2015   │     0:00  │  0

A exposição CU É LINDO é um projeto iniciado a partir da necessidade de dar visibilidade ao ânus, parte do corpo abjetada por muitas sociedades, mesmo as contemporâneas.

Com a intenção de dar visibilidade ao tão moralizado ânus, o projeto “Cu é Lindo” pretende divulgar fotos, textos, poemas e performances para uma exposição pra lá de interessante e coletiva – cujas inscrições estão abertas até o dia 25 de fevereiro.

Os artistas maranhenses Gê Cuarauara Viana e Layo Bulhão encabeçam a ideia e traçam um percurso sobre as questões envolvendo a diversidade, gênero, sexualidade, público e privado, corpos, objeções e falso moralismo. Como colaboradores entram neste projeto a Profª Drª Viviane Rocha e Carolina Libério.

Para realizar a curadoria da exposição foram convidados os artistas Mavi Veloso/SP-BELGICA cujo trabalho se aprofunda sobre as questões de gênero e sexualidade direcionadas a performance e inserções no cotidiano, Matheus Santos/BA-RJ doutorando em estudos de imagens abjetas e Erivelto Viana/MA um dos principais nomes da performance e das artes maranhenses da atuallidade.

 “O ânus é a primeira parte do corpo que é privatizada. Partindo desse ponto de origem, queremos a dessacralização do cu, ou seja, propomos uma exposição universal dessa parte tão significativa e importante à existência humana”, diz o texto de divulgação.

Qualquer pessoa pode participar, independente da nacionalidade, credo, gênero ou idade, inclusive de forma anônima – CLIQUE AQUI. E todos os trabalhos enviados serão expostos, sem qualquer tipo de competição. “Não tem caráter competitivo, o cu não compete, ele é”.

A curadoria será dos artistas Mavi Veloso/SP-Belgica, que tem trabalho sobre questões de gênero e sexualidade direcionadas à performance e inserções no cotidiano, Matheus Santos/BA-RJ, doutorando em estudos de imagens abjetas e Erivelto Viana/MA, um dos principais nomes da performance e das artes maranhenses da atualidade.

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