Casa de Apoio Brenda Lee reabre serviço de acolhimento a travestis e transexuais
   29 de junho de 2016   │     0:00  │  1

O serviço de acolhimento da Casa de Apoio Brenda Lee, voltada para travestis e transexuais com HIV, reabriu as portas em março deste ano e já abriga 15 pessoas. O atendimento ficou suspenso por quase cinco anos. Por conta da reabertura e do importante capítulo que a ONG ocupa na história de enfrentamento ao HIV, a Agência de Notícias da Aids começou dia (24) uma série de reportagens sobre ela. É uma homenagem a sua fundadora, Brenda Lee, e ao legado que ela deixou com a casa que possibilita melhor qualidade de vida a um público diariamente violentado, marginalizado e estigmatizado pela sociedade.

O lugar que oferece acolhimento, abrigo e caminhos para emancipação das travestis carrega essa característica social desde o começo de sua história, em 1984, quando Brenda Lee comprou o imóvel para morar e ser uma pensão. Lá, a travesti Brenda, assassinada em 1996, acolhia as jovens expulsas de seus lares e abandonadas por suas famílias, por causa da sexualidade.

No período em que não houve acolhimento, de 2011 a 2015, cursos como de maquiagem, cabeleireiro e manicure continuaram sendo oferecidos. “As atividades de acolhimento foram encerradas porque a diretoria não sabia mais lidar com o novo perfil das acolhidas. Na época da Brenda, a maioria dos usuários era de travestis que vinham da Europa doentes de aids. Em 2011, já eram travestis mais jovens, usuárias de drogas, que precisam até de reabilitação. Por falta de estrutura para lidar com o novo perfil, a procura também foi diminuindo”, explica o assistente social Thiago Aranha, atual diretor-presidente da Casa de Apoio Brenda Lee.

Outro fator que pesou na decisão de encerrar o acolhimento causou muitos problemas entre as usuárias. Era a antiga regra da quarentena. Ou seja, como chegavam com a saúde debilitada pelo HIV, vindas de hospitais especializados, como o Emílio Ribas, elas precisavam ficar 40 dias sem sair às ruas a partir do dia do acolhimento. A regra foi perdendo a razão à medida em que os novos tratamentos para HIV/aids foram se tornando mais eficientes. “Uma das primeiras mudaças que fiz foi extinguir essa regra”, conta Thiago.

Mas, além do acolhimento, de acordo com Thiago, a ONG correu o risco de fechar, pois a antiga presidente, Maria Luiza, por motivos pessoais, não poderia mais responder por ela.

“Ela me falou que não podia continuar e sugeriu que eu assumisse. Tive medo, não sabia se conseguiria, mas a dona Luiza me apoiou e eu acredito que um lugar com toda essa história não pode fechar. Conversei com pessoas da área, busquei ajuda e conselhos sobre o que poderia fazer e estou aqui, desde 2014.”

Já em 2013, a diretoria da ONG começou a se reestruturar para a retomada do serviço de acolhimento, revendo documentos, normas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), adaptações,  atualizações e promovendo rodas de conversa com os interessados.

24 horas

A  casa de quatro andares tem seis quartos ocupados, capacidade para atender 25 usuárias, salas de estar, de TV, para acolhimento, cozinha, banheiros, recepção, laje com varanda e funciona 24 horas por dia.

“A pessoa que quer vir para cá precisa conversar com um assistente social ligado a casas de apoio ou ser encaminhada por algum serviço de saúde”, informa Thiago. Segundo ele, um dos motivos para essa orientação é o acompanhamento no tratamento do HIV. “Nós temos um arquivo de todos os usuários e acompanhamos o tratamento. Muitas delas vêm direto do hospital. Por isso, precisamos desse cuidado e controle”.

Entre orientadores, auxiliar de limpeza, de cozinha, psicólogos, estagiários e voluntários trabalham direto na casa cerca de sete pessoas remuneradas, fora os seis integrantes da diretoria, que são voluntários. Embora tenha como foco travestis e transexuais, a Casa de Apoio Brenda Lee também abriga dois jovens gays que precisavam de cuidados e abrigo, pois receberem alta do hospital e não têm para onde ir.

“A Brenda dizia que tudo o que a sociedade rejeitava, ela acolhia. Se um homossexual estava com aids e todo mundo dava as costas para ele, ela ia atrás, trazia pra cá e cuidava. Buscamos trazer sempre esse exemplo para o nosso dia a dia”, explica o diretor.

A ONG se mantém com um incentivo recebido de uma parceria entre estado e município, o aluguel de um terreno que comprou com o objetivo de construir uma nova casa de apoio e as vendas de objetos doados ao brechó. “Fazemos o possível para fechar a conta todo mês e não ter emergência, mas ainda precisamos de muita ajuda”, afirma Thiago.

Por uma parceria feita pelo projeto municipal Transcidadania, as travestis e transexuais estão estudando. Um quadro indicando vagas de emprego fica pendurado na sala de estar. “Nós queremos que elas tenham autonomia, liberdade, sejam emancipadas, enfim, possam se sustentar e viver com segurança. Então, buscamos meios para isso,” explica Thiago.

“Aqui é uma casa de primeira. Eu não imaginava que seria recebida assim. A gente come bem, cuida do nosso espaço e tem cinco refeições por dia”, conta Poliana, que está há um mês na ONG, se recuperando de uma cirurgia feita depois de ter sido esfaqueada pelo ex-marido.

Palácio das Princesas

Em 1985, um ano depois de ter comprado o imóvel no bairro da Bela Vista, aconteceu uma série de assassinatos de travestis em São Paulo, Brenda, então, acolheu um número maior de meninas e, assim, a pensão recebeu o nome de Palácio das Princesas. Com o tempo, algumas de suas amigas começaram a aparecer doentes e ela as acolhia também. Até que recebeu o primeiro paciente portador do vírus HIV, em 1986, e virou casa de apoio.

“Ela ajudou as pessoas num momento que ninguém sabia nada sobre a aids. Recebeu e cuidou dos primeiros casos da doença e também tinha uma ala para cuidar das que estavam com tuberculose”, continua Thiago, que, antes de ser diretor-presidente da ONG, era voluntário.

“Após seu assassinato, a família não quis assumir a casa, que foi comprada, virou ONG e foi assumida por uma diretoria que queria respeitar a memória dela e continuar o trabalho”, diz o diretor.

Na próxima reportagem, contaremos a história de Poliana e de outras pessoas que vivem na casa.

Serviço

Casa de Apoio Brenda Lee

Tel.: (11) 3112-1384

Rua Major Diogo, 779, Bela Vista, São Paulo – SP

Fonte: Agencia Aids

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