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Viado, bicha e sapatão ! Qual é a origem dessas palavras ?
   3 de maio de 2021   │     9:28  │  0

Seja qual for o motivo, ser chamado por estranhos de “viado” ou “bicha” (no caso de gays) e de “sapatão” (no caso de lésbicas) soa ofensivo. Porém, entre LGBTs, esses termos são usados como gírias ou brincadeiras, sem nenhum intuito de agredir ou constranger.

O que ninguém sabe ao certo é quando ou como essas expressões surgiram. Fato é que existem várias teorias para explicá-las –e até mesmo os especialistas em linguística divergem entre si. “Com relação a esses três termos, é importante dizer que fixar no tempo e no espaço sua origem é algo bastante complicado. Por esse motivo o mais adequado é falar de ‘possíveis origens'”, explica Stela Danna, doutoranda em linguística pela USP e pesquisadora do Centro de Documentação em Historiografia Linguística (CEDOCH-DL/USP).

Veado ou desviado da “normalidade”

Em se tratando de “viado”, esse termo aparece no dicionário como uma forma antiga de chamar um tecido de lã, com riscas ou veios. “Já a alternância da grafia ‘viado’ ou ‘veado’ para designar homens homossexuais indica duas possíveis origens. Há quem insista em usar ‘viado’, por acreditar que o termo teria vindo das palavras ‘desviado’ ou ‘transviado’, ou seja, pessoas que teriam se ‘desviado de uma normalidade’, ideia preconceituosa e bastante difundida durante a ditadura militar. No entanto, o mais provável é que ‘viado’ tenha vindo da palavra ‘veado’, usada para designar um animal mamífero, veloz, delicado e tímido”, comenta Stela.

A pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) também aponta como principal referência de veado o personagem Bambi, lançado por Walt Disney em 1942. “Além de ter características ainda vistas como sinais de fragilidade e muitas vezes associadas ao feminino, os veados, durante o período de reprodução e sem poderem contar com uma fêmea, acabam depositando o esperma em outros veados. Todos esses aspectos teriam contribuído para que se associasse o termo aos homens homossexuais”, acrescenta Stela.

De fêmea do veado à prostituta

Já o termo “bicha”, de acordo com Stela e James Green, historiador especializado em estudos latino-americanos e ativista dos direitos LGBT, remontaria à corça, fêmea do veado, que em francês é chamada de “biche”. “Esse termo começou a ser usado no Brasil no início do século 20”, explica Stela.

“Parece plausível que os homens que frequentavam a subcultura estivessem simplesmente fazendo um trocadilho com a palavra ‘viado’, ao que adotaram um toque de sofisticação com o uso do termo francês. Além disso, ‘biche’ era também usado na França como um termo afetuoso para uma jovem mulher”, observa Green em seu livro “Além do Carnaval: A Homossexualidade Masculina no Brasil do Século 20”. Segundo Green, bicha também era empregado no passado como sinônimo de prostituta e seria possível que prostitutos efeminados costumassem se referir, em tom de brincadeira, a seus amigos e colegas como ‘bichas’.

“É importante perceber que, assim como ‘viado’, a palavra bicha também está ligada ao feminino. Esses termos acabaram sendo entendidos como sinônimos de passividade e fragilidade, ideias que caracterizavam as mulheres em um mundo dominado pelos homens”, diz Stela, lembrando que a partir da década de 60, pessoas machistas e conservadoras se apropriaram do termo para usá-lo contra homossexuais, atribuindo-lhe uma carga pejorativa.

No caso de “sapatão”, as possíveis origens divergem de época e contexto, mas, em comum, remontam a atitudes de transgressão e resistência. “A primeira delas remete aos poemas sobre amores lésbicos do poeta Gregório de Matos (1636 – 1696), em que aparece a figura de uma mulher chamada Luiza Sapata. A segunda hipótese parece estar relacionada aos calçados masculinos, pois na década de 1970, com uma nova retomada do movimento feminista, algumas mulheres teriam passado a usar esses ‘sapatões’, em vez dos modelos femininos. Os calçados masculinos eram maiores, menos delicados e mais confortáveis. Essas mulheres então acabaram sendo identificadas como ‘sapatão'”, diz Stela.

Quem tem opinião semelhante à de Stela sobre a origem baseada nos “sapatões masculinos” é o etimologista Reinaldo Pimenta, que no livro “A Casa da Mãe Joana 2: Mais Curiosidades nas Origens das Palavras, Frases e Marcas” diz que a expressão “surgiu na década de 1970, quando as mulheres com orientação sexual alternativa (lésbicas) tinham predileção por usar esse tipo de calçado, mais caracteristicamente masculino”.

Já nos livros “A Vida Íntima das Palavras” e “De Onde Vêm as Palavras”, outro etimologista, Deonísio da Silva, lembra que “em décadas passadas, conhecida música de programa de auditório dizia: ‘Maria sapatão, sapatão, sapatão. De dia é Maria, de noite é João'”. Porém, segundo a pesquisadora Stela, a marchinha de carnaval “Maria Sapatão”, escrita por João Roberto Kelly e cantada pelo apresentador Chacrinha, nos anos 1980, não lançou o termo associado a lésbicas, mas teve o papel significativo de popularizá-lo por todo o Brasil.

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A origem da utilização da palavra “veado” para designar homossexuais no Brasil
   14 de abril de 2017   │     22:45  │  0

Sabemos que o Brasil é um país muito ignorante, mas às vezes ele nos oferece coisas surpreendentes ligadas à cultura. Por exemplo, só aqui existe o adjetivo “balzaquiana” (sempre no feminino) para qualificar as mulheres que passam dos trinta anos. Sei que a expressão baseia-se apenas no título de um dos piores romances de Balzac, A Mulher de Trinta Anos, porém, o simples fato de qualquer brasileiro utilizar uma expressão tão literária para designar a idade de certas mulheres, deveria denotar uma intimidade com as letras que somos obrigados a não reconhecer… Imagine se esta qualificação fosse cunhada na Inglaterra – todos nós imaginaríamos ser isto mais uma prova de que os ingleses são cultíssimos!

Por isto, assombra-nos ainda mais que nosso povo chame de veados a nossos homossexuais. Primeiramente, é mister derrubar a hipótese errônea de que a palavra seria escrita como “viado”, tendo sua origem numa simples corruptela de “desviado”. O estigma de ser um desviado, além de uma agressão aos homossexuais, é ridículo, ainda mais se considerarmos as opções vernaculares disponíveis.

Tudo deriva de um inesperado conhecimento de nosso povo sobre a vida e a reprodução dos veados. Explicarei como isso se dá. A veada (ou veado fêmea) entra no cio e passa, com suas emanações, a atrair os machos. Obviamente, muitos machos se candidatam, mas ela é uma natureza fiel, e manterá relações com apenas um dos animais. Como muitas vezes acontece na natureza, não será ela quem escolherá seu parceiro. Serão eles que travarão uma série de lutas para decidir quem a merecerá. Durante essas refregas, a produção de esperma dos machos intensifica-se e eles ficam inteiramente voltados para disputa, sendo que muitos deles, neste ínterim, perdem 15% de seu peso.

Ultrassonografia de um testículo de veado lotado de esperma antes de ser “aliviado”

Depois disso, o veado vencedor aproxima-se da veada e eles mantêm um longo coito em que ele deposita enorme quantidade de sêmen na fêmea e que é assistido pelos perdedores. Ora, eles não se retiram do local porque ainda tem algo a fazer. Quando o macho vencedor desprende-se da veada, eles, um a um, formando uma fileira desorganizada, denominada nos círculos científicos de “Fila de desopilação”, curam seu ressentimento montando-se uns às costas dos outros — todos machos — penetrando-os, com a finalidade de se aliviarem. Depois fazem a troca, pois todos devem se livrar do esperma. Claro, a natureza é sábia: eles, após produzirem por volta de 300 ml de esperma em cada testículo, mal podem caminhar — então como poderiam ir de árvore em árvore para alimentar-se ou fugir de algum animal maior? Nos homens, este fenômeno é chamado por muitos — e aqui meus leitores mais sensíveis e as crianças hão de me perdoar — de “dor nas bolas” e ocorre quando uma grande excitação sexual acaba em malogro.

Flagrante de uma “Fila de Desopilação”

Após este ritual, é comum que alguns destes veados perdedores passem a demonstrar certa afeição entre si. Há também aqueles que passam a acompanhar o casal vencedor até o nascimento do veadinho, mas nossos cientistas garantem: eles sempre demonstram acentuado interesse pelo macho. Alguns passam a fazer parte da família e, quando da ocorrência de outro embate por uma fêmea, escolhem perder, brigando apenas até obterem maior produção de esperma. Dir-se-ia que cumprem carnê.

Dois veados machos ligados pelo afeto

Ora, estes seres cujas escolhas parecem inadequadas à preservação da espécie não devem ser escamoteados ou considerados de menor importância, pois são eles que se atiram em sacrifício quando da presença de algum animal mais forte e ameaçador à família, muitas vezes rasgando-se todos.

Por que o “Animal`s Planet” e os programas sobre a vida animal não divulgam tais verdades? A resposta é clara. Primeiro, temos de considerar que, de cada dez palavras que circulam pelas agências internacionais de notícias e de cada dez minutos de transmissão televisionada no mundo, temos, respectivamente, nove palavras e 8 minutos e 23 segundos de responsabilidade ou norteamericana ou de entidades religiosas, sejam estas católicas, protestantes ou muçulmanas. Sabendo-se que tais sociedades caracterizam-se por uma forte deturpação de evidências, é normal que fatos de indiscutível veracidade venham a ser omitidos ou mesmo falseados.

Não vejo motivo para que continuemos a turvar a realidade desta maneira, não vejo que prejuízo nossas crianças teriam de soubessem da fila de desopilação dos veados e sempre fui de opinião de que A los niños hay que decirles siempre la verdad, no hay que asustarlos con cucos, brujas, ogros, temibles personajes imaginários pero con cosas más reales, como nos ensina a melhor pedagogia argentina.

Não sei como, quando e nem quem passou a chamar nossos homossexuais de veados, mas esta pessoa — talvez um veterinário — certamente tinha informações privilegiadas sobre a vida animal e fez uma analogia com a vida humana que,  se está longe de constituir-se num exato paralelo, é demonstradora de grande cultura. Acredito que nosso leitor Charlles Campos poderá confirmar todas as verdades aqui externadas e que juntos criaremos importante e esclarecedor verbete na Wikipedia.

Fonte: Milton Ribeiro

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