Lesbofobia já fez 8 vítimas no Brasil este ano
   12 de janeiro de 2018   │     0:00  │  0

Quando publicamos a triste notícia do assassinato de Anne Micaelly em Brasíliaacreditávamos que se tratava de um primeiro e chocante assassinato de lesbofobia. Mas fomos alertadas pela página Lesbocídio (https://lesbocidio.wordpress.com/) que já se contabilizam 8 assassinatos no 8 de janeiro, isto é, um assassinato por dia. Dedicamos este breve artigo a refletir como chegamos nesta situação e porque o capitalismo é responsável por essas mortes.

Todo começo de ano zeramos o número de LGBTs assassinadas e recomeçamos a contar. Ano passado foram ao menos 277, destes 179 foram pessoas trans segundo a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). Este ano já perdemos Fany, travesti assassinada a tiros em Belém no terceiro dia do ano. Mas uma escandalosa noticia é que foram oito lésbicas assassinadas em casos declaradamente lesbofobicos, mulheres que viviam uma sexualidade por fora da heteronormatividade imposta, isto é, que pelo simples fato de se relacionarem com outras mulheres, a sociedade machista e patriarcal tirou suas vidas.

Hoje uma mistura de medo, ódio e dor toma as mentes e corpos que vivem o luto dessas mulheres que não necessariamente conhecemos, mas que poderiam ser qualquer uma de nós.

Anne, Mayara, Rithynha, Clarice, Arianne, Eliane, Camila foram arrancadas da vida por crimes de ódio que tem culpados concretos: o patriarcado e o capitalismo, cujo perfeito casamento garante a normalidade destas mortes.

Mas muitas vezes que dizemos isso, nos perguntam, mas o que o capitalismo tem a ver com isso?

Primeiro é preciso entender que capitalismo não se trata apenas de uma postura de governo, mas fundamenta-se pelo modo de produção com qual utilizavamos para nossa sobrevivência. Numa sociedade que é dividida em classes sociais, a opressão à sexualidade ou a identidade de gênero, assim como a opressão por questões etniticas, migratórias ou regionais está intrinsicamente ligada à exploração do trabalho e a manutenção do status quo.

Em meio à uma das mais profundas crises deste sistema, que por hora não encontrou nenhuma saída contundente, ao a classe trabalhadora e os grupos oprimidos não proporem uma saída própria que garanta a sua emancipação, os governos e patrões de todo o mundo buscam descarregar nas nossas costas a crise econômica com aprovação de reformas e uma ampla retirada de direitos sociais. O Brasil que passou recentemente por um golpe institucional para garantir os ataques aos trabalhadores e setores oprimidos, tem aumentado a morte de LGBT sendo que já éramos considerado o país que mais mata por ódio as LGBT. Os números passaram de a cada 28 horas, para 26 e depois 23 horas. Ou seja, pelo menos todos os dias um de nós é brutalmente assassinato sem qualquer punição ou inclusive reconhecimento.

Quando falamos das mulheres lésbicas – sejam elas cis ou trans – estamos falando de uma dupla ou tripla opressão que se relacionam de formas muito particulares na sociedade capitalista.

Primeiro que o direito ao corpo sempre nos é negado. Não nos ensinam a conhecer nosso corpo, nosso prazer e nossos desejos. Pelo contrário, aprendemos a servir, a aceitar e a obedecer. Somos incentivadas pela cisnormatividade e heteronormatividade a seguir um padrão de beleza opressor e buscar uma feminilidade muitas vezes agressiva à nos mesmas. Quando buscamos acompanhamento médico, nos dizem que não fazemos sexo, porque parece inconcebível, ainda nos dias de hoje, que mulheres tenham atração sexual por conta própria e pior que possamos desenvolver relações sexuais e afetivas com outras mulheres. Somos as únicas presas pela monogamia, já que sabemos que a instituição do casamento surgiu há milhares de anos atrás junto a propriedade privada e a capacidade das mulheres cis comprovarem visualmente sua maternidade impunha nossa castração sexual para garantir então a paternidade. Em poucas palavras, olhar o mundo com os nossos olhos, é a única forma de entender o quão cruel é o capitalismo e de como este sistema nos reserva miseravelmente um horizonte muito estreito, atrofiando nossos cérebros com o trabalho doméstico e com a retirada da nossas próprias mãos do destino do nosso corpo e do nosso prazer.

Mas então quem está por trás desses assassinatos?

A cada notícia que chega as mídias de um brutal assassinato LGBT, encontramos sempre alguns “erros” irritantes. Primeiro se for uma pessoa trans, fazem questão de mata-lá pela segunda vez expondo seu nome de registro e geralmente buscando justificativas nela própria para seu trágico assassinato. Quando se trata de homens gays buscam dizer o quanto eram promíscuos ou dizer que não se trata de homofobia, mas “suicídio” ou “crime passional”. Mas e quando falamos de mulheres lésbicas? A invisibilidade que tanto ofusca a dramática realidade de violência começa a promover outras marcas. Sempre buscando revitimizar as vitimas.

Em cada um destes casos, há uma guerra silenciosa que nós tentamos travar. Entre estes meios tradicionais querem nos passar a ideia de que são casos isolados, atrocidades ímpares com indivíduos responsáveis, ignorando toda a cadeia de opressão estrutura nesta sociedade patriarcal e capitalista que legitima e reafirma toda a forma de desigualdade e opressão. Querem que nós vejamos como vítimas impotentes e com medo de sermos as próximas.

Ainda assim, hoje não se pode dizer que toda a mídia seja igual. A primeira exibição de um personagem retratando a transição de um homem trans ou o beijo entre duas meninas na Malhação nestes primeiros dias do ano mostra um espaço que a mídia não quer deixar passar por fora do seu controle.

Tudo bem ser LGBT desde que respeitem a moral desta sociedade. Desde que não se questione os pilares da repressão sexual que atinge o conjunto das pessoas, mas que deixam marcas profundas na vida das LGBT.

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