Ex-defensores da ‘cura gay’ aconselham outros pais religiosos após morte do filho
   1 de dezembro de 2014   │     12:00  │  0

O filho de Linda e Rob Robertson morreu de overdose em 2009, aos 20 anos  Foto: Elaine Thompson / AP

O filho de Linda e Rob Robertson morreu de overdose em 2009, aos 20 anos
Foto: Elaine Thompson / AP

Aos 12 anos, o jovem Ryan Robertson contou para a mãe que era gay em uma conversa pela internet. Apesar de incrédula, a família, muito religiosa, disse ao rapaz que o amaria, mas pediu para que ele tentasse seguir a Bíblia e fizesse terapia reparadora, uma espécie de “cura gay”. Após lutar contra a homossexualidade por seis anos, Ryan fugiu de casa, se viciou em drogas e sumiu por um ano e meio. O jovem retomou o relacionamento com os pais, mas morreu de overdose dez meses depois. Hoje, a família participa de grupos de apoio a outras famílias com filhos gays.

A família Robertson mora em Washington, nos Estados Unidos. Além dos grupos de apoio, Linda, mãe de Ryan, criou um blog para contar a história do filho e aconselhar pessoas que vivem situações similares. Naquela conversa online entre ela e o filho, ele afirmou que não gostava da namorada da época e sabia que era gay, assim como ela sabia que não era lésbica. “Eu não gosto da Hannah. Ela é só um disfarce”, relembra.

Na página inicial, ela resume os quase 9 anos que viveram com Ryan desde que ele se assumiu. A princípio, todos acreditavam na “cura gay”. “(Quando ele se assumiu), dissemos tudo o que pais amorosos que acreditavam na Bíblia deveriam dizer: nós te amamos e isso é muito, muito difícil. Mas sabemos o que Deus fala sobre isso, então nós teremos que tomar decisões muito difíceis. (…) Outros homens passam pelo mesmo problema, mas Deus agiu neles para mudar seus desejos. Nós te daremos os livros deles, você pode ouvir os depoimentos deles. E nós confiamos em Deus nisto. (…) Você é jovem e a sua orientação sexual ainda está se desenvolvendo. Os sentimentos que você tem por outros homens não te faz ser gay. Então por favor não diga a ninguém que você É gay. Você ainda não sabe quem é. A sua identidade não é a de um gay, é a de um filho de Deus”, conta Linda.

Segundo ela, a família acreditava que o sacrifício de Ryan os levaria a “uma vida abundante, cheia de paz e recompensas eternas” e durante seis anos o jovem pediu para que Deus o ajudasse a sentir atração por mulheres, foi batizado, memorizou as Escrituras, encontrava o pastor semanalmente, participava de grupos de jovens na igreja, leu livros que “afirmavam saber de onde seus sentimentos homossexuais vieram” e teve uma relação conturbada com os pais.”Ele fez muitos amigos heterossexuais, como a terapia reparadora aconselhava. Ele até se assumiu para o grupo de amigos, dando seu testemunho de como Deus o resgatou do inimigo. (…) Mas nada mudou”, afirma a mãe. “Acreditávamos que o Deus do Universo, aquele para o qual nada é impossível, poderia fazer com que Ryan fosse heterossexual.”

Linda conta que, aos 18 anos, Ryan estava em depressão, com aspirações suicidas, desiludido e convencido de que nunca seria amado por Deus. “Involuntariamente, ensinamos Ryan a odiar a sua sexualidade. E como a sexualidade não pode ser separada de uma pessoa, ensinamos Ryan a odiar ele mesmo”, acredita. Nesta época,o jovem largou tudo se viciou em drogas. Começou com maconha e cerveja, mas em seis meses já estava usando cocaína, crack e heroína. “Ele era viciado desde o início e a sua raiva contra Deus só alimentou o vício”, disse a mãe.

Em pouco tempo, a família perdeu o contato com o rapaz, que ficou desaparecido por um ano e meio. Foi nesse período que eles começaram a mudar de pensamento. “Paramos de orar para que Ryan virasse hetero. Começamos a orar para que ele soubesse que Deus o amava. Paramos de orar para que ele nunca tivesse um namorado. Começamos a orar para que um dia ele pudesse encontrar o seu namorado. Paramos até de orar para que ele voltasse para casa, só queríamos que ele voltasse para Deus”, diz.

Quando voltou para casa, Ryan perguntou se os pais o perdoariam, se ainda o amavam e se poderiam amá-lo com um namorado, e Linda não hesitou em responder que sim: “Chorando, disse a ele que poderíamos amá-lo com quinze namorados. Nós só o queríamos de volta em nossas vidas. Nós só queríamos ter uma relação com ele de novo… E com o namorado dele.”

A mãe do jovem conta que, a partir daí, uma nova fase começou na vida da família, cheia de “cura, restauração, comunicação aberta e graça”. “Deus estava presente em cada passo do caminho, nos conduzindo e orientando, gentilmente nos lembrando de apenas amar o nosso filho e deixar o resto com Ele”, recorda em um trecho. Linda diz que aprendeu a apenas amar o filho, sem poréns, sem condições, só por ele existir. “Aprendemos a amar qualquer pessoa que o nosso filho amasse. E foi fácil. Aquilo que eu estava com tanto medo acabou se tornando uma bênção”, acredita.

Um dia o jovem foi encontrar os antigos amigos e acabou usando drogas pela primeira vez em 10 meses. Ryan chegou ao hospital em coma, em condição crítica e passou 17 dias internado antes de falecer, em 16 de julho de 2009: “Perdemos a capacidade de amar o nosso filho gay, porque nós não tínhamos mais um filho gay. Então tudo o que nós desejamos, oramos e esperamos que acontecesse, que não tívessemos um filho gay, aconteceu. Mas não da forma como imaginávamos”.

Linda conta que, ao olhar para trás e pensar nos seis anos em que tentou “curar” o filho, percebe “o quanto foi boba” e afirma que estava com medo de todas as coisas erradas: “Agora, sempre que eu e Rob visitamos os nossos amigos gays, pensamos em como seria incrível visitar Ryan e seu parceiro para um jantar”. A família visita o túmulo do rapaz frequentemente, usa roupas laranja, a cor que ele gostava, e ainda comemora os aniversários dele.

“Dividimos a nossa vida em AC (antes do coma) e DM (depois da morte), porque somos pessoas diferentes agora, a nossa vida mudou muito, em milhares de formas, por causa da morte dele. (…) Oramos para que Deus, de alguma forma, use a nossa história para ajudar outros pais a amar verdadeiramente os seus filhos. Somente por eles existirem”, finaliza.

Atualmente, Linda e Rob comandam uma organização de apoio a portadores de AIDS, contribuem com um site da comunidade gay, lançaram um grupo LGBTTS na igreja que frequentam e rodam os Estados Unidos fazendo palestras em nome da comunidade LGBTTS.

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