A era da homofobia e do machismo incontestados
   19 de julho de 2014   │     0:00  │  0

Estamos no século 21. Achava que era 2014? Nahhh… acho que não. Ou me recuso a pensar que, já tão avançados no tempo, ainda sigamos presenciando coisas do século 19.

Pois bem, a verdade é que as duas cenas abaixo foram presenciadas no espaço de dois dias. Ou seja, devem ocorrer aos montes todas as horas. E nos fazem pensar que, depois da era do racismo incontestado, em que um branco se levantava de um banco de ônibus quando o negro se sentava ao lado, hoje vivemos a era da homofobia — e do velho machismo — incontestados. Tão incontestados que as próprias vítimas ou dão de ombros ou reforçam o problema.

Vejam só:

CENA DE HOMOFOBIA

Eu estava no cinema, no último domingo. Fazia muito tempo que não ia ao cinema. Por isso, animada, cheguei antes de todos e fiquei comendo minha pipoquinha, e observando as pessoas que se sentavam depois.

A umas cinco fileiras de mim, à minha frente, havia um casal heterossexual. Uma mulher, mais perto do canto da fileira, e o homem, mais centralizado. Eis que surge outro casal, agora homossexual. Eles param pouco antes da mulher para conferir os números de suas cadeiras. Descobrem que são aquelas ao lado do homem, e dirigem-se para lá.

Passados menos de dois segundos de os dois terem se acomodado, o homem do casal hétero pede para trocar com sua mulher de lugar. Como se tivesse levado um choque: um gay se senta ao seu lado e ele já salta imediatamente do lugar. Pior: sua namorada concorda sem contestar. Os dois trocam de posições, sob os olhares constrangidos de quem assistia à cena — no caso, eu. Os gays, provavelmente calejados com esse tipo de sinal de desprezo, dão de ombros.

CENA DE MACHISMO – esta foi presenciada pela socióloga Neuza Lima, que escreveu o surpreendente relato abaixo:

“Eu estava num bar e, numa mesa próxima à minha, um grupo de amigos estavam bebericando. Na mesa, algumas mulheres e apenas dois homens. Um deles, totalmente alterado pelo álcool, começou a querer beijar todas as mulheres na boca. Uma delas se recusa, e ele a chama de vagabunda. Ela retruca: ‘Vagabunda é sua mãe!’

Ao ouvir isso, ele a agride fisicamente, dando-lhe um tapão nas costas com as duas mãos. Tão forte, que ela caiu na mesa.

E ele sai correndo, ileso.

Ela, aos prantos, começa a se culpar (!). Diz: ‘Isto aconteceu porque eu sou uma mulher sem homem, mulher sem homem não pode sair de casa, pois é vista como mulher de todo mundo, todos podem tirar uma casquinha, independente de sua vontade!'”

Levamos anos para que o racismo começasse a ser contestado. Hoje, qualquer cena de racismo explícita é brutalmente criticada, existem campanhas, processos judiciais etc. E, mesmo assim, o problema ainda está longe de ser eliminado, infelizmente. No caso da homofobia e do machismo, em que a contestação ainda é muito pequena e que as próprias mulheres contribuem para reforçar e retransmitir a parte que as afeta, quanto tempo será que levaremos para nos ver livres desses problemas? Um chute: nunca.

Por: Cristina Moreno de Castro

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